MELLO, Tyrone Andrade de, Resenha do livro BARCELLOS,
CACO. Rota 66: A história da polícia que mata. Rio de Janeiro: Record, 2003 (apresentada na disciplina de Geografia do Brasil do curso de Geografia da UFRGS, semestre II de 2015)
Caco
Barcellos é jornalista gaúcho e tem um programa atualmente na Rede Globo:
Profissão repórter. Nesta obra ele conta sua pesquisa investigativa que abrange o período de 22 anos de ação dos
matadores da Rota: Ronda Ostensiva Tobias de Aguiar. Ele
examina todos os casos registrados como tiroteios desde o dia 9 de abril de 1970 quando houve a
fusão da Polícia Civil com a Polícia Militar para a criação da Polícia Militar
de São Paulo, formando o temível Esquadrão
da Morte de São Paulo.
O
nome “matadores” o autor diz “assim como da unidade a que pertencem, se repetem com grande freqüência no Banco de Dados. Não há dúvida. Eles fazem
parte de uma minoria concentrada no 1° Batalhão da Polícia Militar de São Paulo,
mas especificamente de uma unidade
considerada a elite da corporação - as Rondas Ostensiva Tobias de Aguiar, Rota.
Alguns são homens experientes, que estão na PM desde a criação da Rota, outubro
de 1970, para reprimir as ações
guerrilheiras de assaltos a bancos. Os primeiros nomes registrados no Banco de
dados, como matadores, são de PMs envolvidos na guerra contra a guerrilha: os sargentos Absalom
Moreira da Luz e Manoel Alves do Nascimento.” (Barcellos, 2003,p.90). O autor
então usa esse termo em toda a sua obra.
O
livro está dividido em três partes:
Primeira parte, Rota 66, depois, Os Matadores, e em seguida, Os inocentes.
A
“Rota 66”
que dá nome à primeira parte da obra é o primeiro caso de três rapazes do Fusca azul (capítulo 1 – a
perseguição). O autor diz “O caso da Rota 66 é a notícia número 255 da fonte NP
(Notícias Populares) da minha pesquisa. Leio com extrema atenção. Para mim, tem
uma grande importância. Anotar os dados dos três rapazes do Fusca Azul
significa, por coincidência que estou completando a leitura sobre tiroteios ocorridos em cincos anos de história da
Polícia Militar de São Paulo” (Barcellos, 2003, p.89) por não pertencerem à sociedade marginalizada.
O
autor com muito cuidado na divulgação do livro “tínhamos
muito para provar” os (Barcellos, 2003,p.337) acusados pela execução por
ordem do comando-geral da Polícia Militar. Assim ele o faz durante toda a obra.
Em Os Matadores, o autor mostra como
agiam os matadores contando a história de Warner Bossato, mecânico de moto
desempregado. Na Terceira, Os inocentes, o autor conclui sua obra contando a
história das vítimas que eram perseguidas pelos matadores. O autor diz “o
resultado do confronto do nosso Banco de Dados com os arquivos da Justiça Civil
revela que 65% das vítimas da PM que conseguimos identificar eram inocentes.”
(Barcellos, 2003,p.327).
Essa
é a organização geral da obra, começando com o espaço de atuação dos Matadores
ou Esquadrão da Morte, em seguida as técnicas e métodos usadas no BO, Boletim
de Ocorrência, à versão oficial dos tiroteios. E por fim, os protagonistas
principais, os cidadão comuns, a classe trabalhadora alvo dessa minoria da
Polícia Militar que é ou era alvo.
A
seguir, alguns detalhamento importantes da obra de Caco Barcellos:
Rota 66
Nesta
parte é composta por nove seções. Caco Barcellos nos conta como agiam o
esquadrão da morte na rota 66, rota 13 (dos três rapazes) que eles atuavam nas
ruas da grande metrópole nacional. Também de Porto Alegre Vila São José no
bairro Partenon, periferia da Metrópole. Esses matadores esteve envolvidos
em supostos tiroteios na companhias dos vinte matadores (capitão, sargento, soldado, cabo).
Os
títulos de cada seção são sugestivos como a “perseguição” que conta a história de três rapazes de classe média
vítimas dos matadores da rota 13. Na seção seguinte “Doutor Barriga” faz
referência ao delegado “era
extremamente grosseiro e violento
conhecido em todo o bairro. Muitas vezes eu havia assistido a suas perseguições aos
ladrões da minha rua. Os vizinhos trabalhadores também são obrigados a se
esconder ou fugir. O delegado considerava todo mundo suspeito. Ao prender
alguém, sempre aplica o inverso da lei. Ao provar a culpa do suspeito, costuma
exigir que o detido prove sua inocência. O meu
maior medo é do batismo do Doutor barriga. Quem é preso pela primeira
vez é punido, no mínimo, com uma noite de castigo no xadrez da viatura.” (Caco,
p26-27).
Nos
títulos das seções seguintes fazem
referência como os três rapazes foram humilhados pelos matadores preconceituosos
“nenhum deles trabalha pela manhã, depois
passam tardes inteiras sentados sobre
as almofadas e o tapete de sisal. O cigarro passando de mão em mão.
Todos sabem que fumar maconha é um ato ilegal, mas não se sentem culpados. Pensam sobre o assunto de
forma parecida. Acham a proibição absurda, estimulada pelo preconceito e a
desinformação. A ilegalidade das drogas é sempre motivo de um longo papo entre
eles, como aconteceu hoje à tarde.” (Caco, p. 42) Nesse caso “reservada aos
heróis” eram os três rapazes, eles não têm o perfil do inimigo que a Rota costuma perseguir, caçando criminosos
comuns, os rapazes eram ricos.
Caco
Barcelos diz que “os PMS do patrulhamento das cidades brasileiras
são orientados pelo comando de militares do Exército Nacional, que tem uma visão
deformada do conceito de segurança pública. Obrigam seus comandados a praticar,
com prioridade, a defesa da propriedade dos mais ricos. O resultado é o que se
vê diariamente nas ruas. Uma perseguição violenta e sistemática exclusivamente
contra o que eles chamam de marginal: o cidadão proveniente da maioria
pobre que causa prejuízo à minoria rica da sociedade.” (Caco, p.34). Essa forma precisa mudar no país, o
preconceito racial e social está longe de acabar.
Os Matadores
Nesta
parte do livro dividido em sete seções nos conta como o esquadrão da morte
agiam nas ruas caçando criminosos comuns
numa perseguição violenta e sistemática.
Aqui o autor novamente se utiliza
dos títulos para referenciar o sangue
frio dos matadores, também nos registros policiais.
Na
seção “Hospital: esconderijo de cadáver”
é exemplar. O autor nos diz “todos foram
unânimes (médicos) em afirmar que, salvo
raras exceções, as vítimas não chegam feridas
ao hospital, mas sim mortas. Alguns corpos até já acusam rigidez
cadavérica, sinal da morte ter ocorrido há mais de três horas. Questionei
por que eles não se negam a internar cadáveres nos hospitais. As razões são
variadas. Cada médico apresenta uma
desculpa pouco convincente, que tem em
comum o medo, a omissão e o desinteresse em enfrentar a polícia para defender
pessoas que a sociedade marginaliza.” (Caco, p.170-171). O autor fez uma
investigação das circunstâncias onde os suspeitos são atacados pelos
policiais e por isso essa seção é riquíssima de informações.
Também
nas seções seguintes o autor conta os
nomes dos vinte maiores matadores da PM, mas nem todos os PMs se identificam de matar civis durante o
policiamento. O soldado Florisvaldo de Oliveira por exemplo o autor
nos diz “conhecido como Cabo Bruno usava um método particular. Muitas vezes
matava nos dias de folga e costumava deixar o cadáver no local do crime ou
desová-lo em outro lugar. Nunca se identificava como autor. Depois de ter sido
denunciado como matador, ele próprio
confessou, em entrevista aos repórteres Hugo Sá Peixoto e Mônica Teixeira, o
assassinato de mais de trinta jovens.” (Caco, p.172).
Os inocentes
Por
fim a terceira parte, é a mais importante, O autor conta as histórias
de algumas das vítimas mortas
pelos matadores. Essa parte se divide em sete seções e, como praxe, os títulos
faz referencia a cada uma das histórias investigadas resultando num banco de
dados: “em 1970, os funcionários do Instituto Médico Legal registraram 62 vítimas de latrocínios, que é crime de
morte praticado durante um assalto. O
índice dos assassinatos de autoria do cidadão comum, o homicídio, era inferior
a dois por dias. Já no primeiro ano de ação policiais militares mataram 28
pessoas. O número da década de 70 mostra que a violência policial foi muito
maior em relação aos dos criminosos e
cidadãos comuns. Os latrocínios pularam de 62 )em 1970) par 276 (em 1980). Os
homicídios, de 666 (em 70) para 1.424 (em 80). Já os assassinatos dos policiais
passaram de 28 (em 70) para 280 (em 80). A diferença se acentua ainda mais ao longo da década de 80. O cidadão comum se
tornou mais violento. De 80 a 90 houve
um crescimento de 300 por centro nos números de homicídios, que passaram a
refletir um alto índice de desarmonia social.” (Caco, p.163-4) Ainda “a partir
de 1990 se observa um grande incentivo aos homens da Rota, que ganharam equipamento e
carros novos. O efetivo aumentou de 250
para 679 homens. A violência dos matadores bateu os recordes.” (Caco, p.166)
A
seção mais exemplar é “Mataram um amigo meu”, amigo do próprio autor que se
chama Fernando Ramos da Silva conhecido como Pixote. Esse personagem é
simbólico praticamente em toda a terceira parte.
O
autor diz “o dia que conheci Pixote, em 1980. Era um menino pobre, de 13 anos, filho de migrantes,
que trabalhava nas ruas ajudando a mãe a vender bilhete de loteria. Acabara de
ser contratado como ator do filme Pixote, a lei do mais fraco, que transformou sua vida.
Trabalhou em outros dois filmes, duas peças de teatro e em uma telenovela de horário
nobre. No primeiro filme, que o tornou famoso, representou o papel parecido com
o dele na vida real: vendedor de
chicletes na rua que se envolvia em
pequenos furtos. O filme acaba com uma
cena em que o diretor prevê um futuro trágico para a vida de Pixote.” (Caco,
p.296). O morte de Pixote é a repetição de vários casos de brutalidade que o autor nos conta no livro, montando
um banco de dados com um volume
de mortos e feridos de civis, O
saldo de 7.500 vítimas da Polícia Militar.
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